quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Então NÃO é Natal. Nem Ano Novo.

Então, como já é sabido por algumas pessoas, eu não nasci judia... Eu fui batizada, fiz eucaristia, até estudei em colégio de freiras quase que a minha vida inteira - e não tinha nenhum problema com isso. Minha família nunca foi religiosa, nunca nos levou à igreja, meu pai era e toda a família dele é espírita, enfim, o convívio lá em casa era mais com D-us do que com qualquer religião ou costume.

Hoje eu dia eu sou tão judia e tão israelense que nem me lembro que um dia não fui. Eu comemoro, junto com o país, os feriados judaicos como se nunca tivesse não comemorado, como se eles sempre tivessem feito parte da minha vida. Às vezes acho isso bizarro, como eu não me sinto estranha, como eu não me sinto um peixe fora d'água? E a verdade é que não me sinto mesmo.

Mas, enfim, o ano todo passa assim, nossos feriados geralmente concentrados entre abril e maio e depois em setembro e outubro, e no resto dos meses eu morro de inveja do resto do mundo que sempre tem uma folguinha aqui e ali...

Nosso calendário é diferente do gregoriano, adotado no mundo todo. Nosso Ano Novo é comemorado em meados de setembro ou outubro e já estamos no ano 5773! Contei um pouco sobre essa festa aqui.

Mas aí chega dezembro e, com ele, as festas de final de ano no resto do mundo. E aí a coisa pega. Todo ano eu me prometo que no próximo eu estarei no Brasil, não para "celebrar" nada, mas para estar no clima, com a família e os amigos.

Aqui, os dias 24, 25, 31 de dezembro e 1º de janeiro são como qualquer outro. Não tem decoração nas ruas, não tem propaganda de Natal, ninguém está estressado fazendo compras, não há reuniões de empresas nem amigo secreto entre os colegas de trabalho, não tem nem Sidra nem peru - e nem chester pra vender! E todo mundo trabalha direitinho, como gente grande!

Aí vão vir os críticos me contradizer e me lembrar que entre os russos e os árabes católicos por aqui (e são muitos!) há, sim, festas, comidas típicas e decoração. Tá bom, tá bom, mas eu não tenho um círculo de amigos russos e árabes (talvez seja uma boa idéia) e até tem um Papai Noel magrelo e feinho aqui e ali nos supermercados russos, mas não, eles não se fazem notar na minha vida. 


Algumas fotos de um supermercado russo aqui em Netanya, tiradas na véspera do Natal:





E eu nunca fui muito fã dessas datas não... Passados os anos onde a fantasia e a magia tomavam conta do Natal, eu até ficava meio deprê, até chorava algumas vezes. Mas já há alguns anos que essa falta do clima todo toma conta de mim nessa época.

Talvez seja apenas inveja do pessoal que vai sair de férias pelo menos por uns dias e do clima que antecede essa tão desejada folga. Talvez seja aquela bobeira de "quando estamos longe é que damos valor", talvez sejam saudades mesmo. Saudades do cheiro da rabanada, das frutas de Natal (aqui temos cereja em julho - o verão - e o cheiro dela sempre me lembra o Natal), dos fios de ovos, que eles nem conhecem por aqui, do panetone, da casa que minha mãe sempre fez questão de decorar da maneira mais linda que ela podia pro Natal, da curtição com a família, das minhas primas, que sempre moraram fora e vinham pras festas, do macarrão com molho branco que minha avó sempre fazia no almoço do dia 25, de morrer de rir das besteiras que meu avô falava e do jeito que ele cantava Frank Sinatra tudo errado, da minha tia se superando nos pratos a cada ano, de viajar pra Santos e curtir a virada do ano com a família do meu pai, na praia, vendo os fogos. Ou de ter outros planos e passar com “a galera”, em Ubatuba, em Floripa... Da calcinha cor de rosa, verde, amarela, branca... dos abraços e da esperança de que aquele sim, seria um ano bom.

E tudo isso me faz falta hoje. Eu passo horas revivendo tudo na minha cabeça, sentindo os cheiros, relembrando tudo. Fico um pouco triste em saber que hoje em dia cada pessoa da minha família está praticamente em um país, ou se foi. Por outro lado, fico muito feliz por ter tantas coisas legais pra lembrar. Eu acho que, com o passar dos anos, nós ficamos mais e mais próximos das influências que tivemos na infância, dos nossos pais, das nossas famílias, dos "nossos", na melhor definição dessa palavra. E nessas horas que a gente sente mais falta disso, dos costumes, das tradições.

Meu filho, meus filhos, vão ser criados como judeus, disso não há dúvidas. Vão viver e comemorar os feriados judaicos, que são também muito ricos em história e costumes, mais até do que os católicos. Faço questão de criar tradições pra cada uma das nossas festas, faço questão de tecer, junto com o meu marido, as lembranças felizes deles nessas datas. Mas sempre que puder, eu quero estar no Brasil nessa época do ano com eles. Vou explicar que esses não são feriados nossos, que não acreditamos no que está sendo comemorado, mas que, como a família da mamãe comemora, os primos deles (botando fé nas minhas irmãs que não casaram até agora...) comemoram, e eles podem sim viver um pouquinho da magia que é o Natal, Papai Noel, família reunida, comida boa, pular 7 ondas etc.

Ninguém vai ser menos judeu por isso. Acho que por ter o background não judaico, eu detesto o radicalismo de umas pessoas, israelenses ou não, de esconder ou querer negar que existem outras religiões bem pertinho de nós. Parece que é um pouco de medo de enfraquecer perante o novo, de de repente começar a acreditar no que "não deve". Eu já acho que o que é sólido não se perde e, se se "perder" (vide a minha própria história), é porque assim que tinha que ser. E ninguém é mais ou menos por acreditar em coisas diferentes.

Não estou na Brasil mais uma vez nessa época do ano. Poderia ter ido, mas preferi chegar quando a loucura toda passar, na metade de janeiro. Como tenho poucas semanas para estar lá, achei mais inteligente chegar quando minha família e meus amigos estiverem livres do stress, das compras, das confraternizações de Natal. Meu filho também é pequeno e ainda não entenderia nada, então posso deixar pra aproveitar toda a “magia” do Natal no ano que vem ou no outro. Mas, este ano, envolta nos preparativos da viagem, tenho tido menos tempo de ficar melancólica. Logo, logo, estaremos juntos de novo.







Luciana Almeida Tub - Nascida em São Paulo, viveu em Campinas e há 7 anos mora em Israel. Casada com um uruguaio e mãe do Uri, que nasceu em fevereiro de 2011. No seu blog, conta um pouco da vida de uma mãe em Israel - Mamash

5 comentários:

  1. Lu achei muito interessante a tua cultura e ter mais de 5773 anos. Para quem já viveu o cristianismo, o Natal e toda a função das festas de fim de ano deve ser mesmo diferente passar o dia 25 de dezembro sem um feriadinho :D Muita diversidade neste mundão, né! Um beijo grande

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  2. Lu, muito legal você dividir sua história aqui. Imagino o quanto deve ser difícil não comemorar natal e ano novo quando você passou "uma vida" celebrando essas datas! Bom, quem sabe na próxima vez você está no Brasil? Independente de acreditar no aspecto religioso, tenho certeza que a experiência será enriquecedora para o Uri. Bjs, Ana Paula

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  3. Eu não sou cristã, mas comemoro o Natal por "tradição" (ou pressão social?). E mesmo que fosse cristã, não acreditaria que cristo nasceu no dia 25/12, todos sabemos que é uma data convencionada mais de três séculos após o seu nascimento, que ninguém sabe ao certo quando foi. Mas gosto de união (ou seria pressão social pela união) e das comidas, assim como me acostumei a gostar da fantasia infantil do Papai Noel. Enfim, às vezes me sinto meio hipócrita fazendo tudo isso sem acreditar; noutras (a maioria), acho que vale a pena, vou criando lembranças nas minhas filhas. E assim sigo comemorando. Neste ano, senti uma falta danada da família expandida. Falei com todos no Skype e escondi as lágrimas que escorreram depois.
    Beijos

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  4. Luciana, fiquei imaginando, e até melancólica, no teu relato sobre os parentes, os pratos gostosos, teu avô... isso tudo é tão fantástico! É como vc disse, é a nossa tradição (em cada casa, em particular) que faz o encantamento da data!
    Sou cristã, mas não acho que cristo tenha nascido nesse dia, ou em tantos outros dogmas católicos inventados por aí. E assim como vc, tbm percebo que as pessoas tem muito medo de conhecer, de saber sobre outras religiões/culturas. E das pessoas que conheço, acho que elas têm medo de saber/perceber/reconhecer que é tudo muito maior do que querem nos dizer.

    Acho que embolei tudo no final! hahaha
    Gostei de te conhecer!

    beijos

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  5. Querida Lu, adorei saber mais sobre vc e a cultura daí. Adorei mesmo! Acho que principalmente nós "maes internacionais" devemos ser abertas à novas culturas, ideias e opinioes. Isso é, como eu escrevi lá no blog, a essência desse grupo e nos enriquece à cada dia mais. Estou adorando a volta que o grupo e o blog deram. É assim que tem que ser!!! Beijos pra vc e até qualquer hora dessas de manha cedo no chat ;o) Bjs Claudia indo pra casaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa.

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